segunda-feira, 27 de julho de 2009

Max Weber - o apuro intelectual (3)


Retomo, após breve interrupção (involuntária), a série de postagens a respeito da conferência A ciência como vocação*, de Max Weber. E aproveito para falar de um conceito-chave do pensamento weberiano: o desencantamento do mundo.

Segundo Tânia Quintaneiro (et al)**,

"A despeito da dimensão iluminista do seu pensamento, na qual a história revela-se como um progresso, existe um Weber pessimista que aponta para as consequências negativas, mas inevitáveis, do processo de racionalização o que dá a sua obra, certamente crítica, um tom de resignação".

Apenas para comparação, esse sociólogo distancia-se (e muito) de um Karl Marx, por exemplo, cuja visão teleológica da história carrega certo otimismo, não obstante seu caráter revolucionário. Mas observemos diretamente aquilo que escreveu Max Weber (acredito que vale a pena ler):

"[O processo de racionalização] Significará que nós, hoje por exemplo, sentados neste auditório, temos maior conhecimento das condições de vida em que existimos do que um índio americano ou um hotentote? Dificilmente. A menos que seja um físico, quem anda num bonde não tem ideia de como o carro se movimenta. E não precisa saber. Basta-lhe ' contar ' com o comportamento do bonde e orientar sua conduta de acordo com essa expectativa; mas nada sabe sobre o que é necessário para produzir o bonde ou movimentá-lo. O selvagem tem um conhecimento incomparavelmente maior sobre as suas ferramentas. Quando gastamos dinheiro hoje tenho certeza que, até mesmo se houver colegas de Economia Política neste auditório, cada um deles terá uma diferente resposta pronta para a pergunta: como é possível comprar alguma coisa com dinheiro - por vezes mais, por vezes menos? O selvagem sabe o que faz para conseguir sua alimentação diária e que instituições lhe servem nessa empresa. A crescente intelectualização e racionalização não indicam, portanto, um conhecimento maior ou geral das condições sob as quais vivemos. Significa mais alguma coisa, ou seja, o conhecimento ou a crença em que, se quiséssemos, poderíamos ter esse conhecimento a qualquer momento. Significa principalmente, portanto, que não há forças misteriosas incalculáveis, mas que podemos, em princípio, dominar todas as coisas pelo cálculo. Isto significa que o mundo foi desencantado. Já não precisamos recorrer aos meios mágicos para dominar ou implorar aos espíritos [...] Os meios técnicos e os cálculos realizam o serviço. Isto, acima de tudo, é o que significa a intelectualização".

Aqui não é necessário acrescentar mais nada. Mas, de certo modo, esta constatação não esvazia a vida de seu sentido mais "profundo"? A isto, Weber oferece uma brilhante reflexão. Contudo, trataremos dela na próxima - e última - postagem da série.

* GERTH, H. H.; WRIGHT MILLS, C. (Org.). Max Weber: ensaios de Sociologia. Rio de Janeiro: Zahar, 1963 [tradução de Waltensir Dutra]

** QUINTANEIRO, Tânia; BARBOSA, Maria Lígia de Oliveira; OLIVEIRA, Márcia Gardênia de. Um toque de clássicos: Marx, Durkheim e Weber. 2 ed. rev. amp. Belo Horizonte, Editora UFMG, 2002