segunda-feira, 28 de novembro de 2011

O que significará editar livros no século XXI? (2)

(tirinha de Adão Iturrusgarai, publicada na Folha de S. Paulo)

André Schiffrin, editor sobre o qual falei na postagem anterior, em entrevista publicada no mês passado*, considera que os e-books, por enquanto, se restringem aos best-sellers, principalmente nos EUA. Mesmo assim, Schiffrin acredita que

"os e-books causam duas situações que a longo prazo serão desastrosas : destroem as livrarias, porque as pessoas compram pela internet, e são vendidos pelo mesmo preço que os paperbacks [reedições em formato econômico], que são a única maneira que as editoras têm para manter a venda de títulos antigos. O fato é que a Amazon não cria obras. Ela vende o que os outros fazem, mas jogando os preços para baixo. Isso, é claro, não é um modelo que possa ser bem sucedido. Se as editoras quebrarem, de onde sairão os livros?"

O que destacar nessa declaração?

De fato, os e-books (e mesmo a oferta de títulos impressos via web) afetarão - como já afetam - o comércio de textos nos seus pontos de venda mais tradicionais, as livrarias. Resta saber se as lojas e os livreiros conseguirão adaptar-se a tempo, para não serem engolidos pela comodidade dada ao consumidor por essas novas formas de adquirir livros. Quanto ao impacto da concorrência direta de uma grande companhia como a Amazon, penso que as editoras "de papel" não têm tanta razão para se preocuparem, pelo menos por ora.

Sobre este último aspecto acima mencionado, gostaria de chamar a atenção do(a) leitor(a) para o que escreve o ensaísta e crítico cultural mexicano Gabriel Zaid.

Num trabalho que não me canso de recomendar (Livros demais!: sobre ler, escrever e publicar**), Zaid não têm receio de afirmar que

"As pessoas envolvidas com o livro (autores e leitores, editores e livreiros, bibliotecários e professores) têm a mania de sentir pena de si mesmas, e uma tendência para se queixar mesmo quando tudo vai bem".

Essas pessoas, de acordo com o ensaísta, "veem como falha o que na verdade é uma benção", porque, diferentemente de jornais, cinema ou televisão, o negócio do livro "é viável em pequena escala". Isso "encoraja a proliferação de títulos e editoras, o florescimento de iniciativas várias e díspares e uma abundância de riqueza cultural". Se pensarmos, acrescento eu, que uma empresa do porte da Amazon, por exemplo, seguindo procedimentos mercadológicos de âmbito global - daí sua aposta em best-sellers - não lançará livros necessários, mas que teriam venda modesta, há ainda espaço para editoras menores.

É possível que Gabriel Zaid esteja sendo otimista além da conta, mas ele parte do princípio de que

"quando a população de um país cresce e este se torna mais rico e mais bem-educado, são publicados, paradoxalmente, mais títulos com vendas menores : aumenta a variedade de especialidades e de interesses, e fica mais fácil atrair alguns milhares de leitores interessados em algo muito específico. Cresce o número de títulos viáveis para a publicação em edições de poucos milhares de exemplares".

Caberia, então, às editoras "de papel" organizarem-se melhor em meio a esse universo de leitores com interesses múltiplos.

Pergunta antipática : ao lado do avanço econômico verificado em alguns países ditos emergentes, como o Brasil, há um avanço correspondente na área educacional para favorecer esse ambiente de pluralidade editorial descrito por Zaid?

Deixarei o questionamento em aberto. Volto no fim da semana, falando de um ensaio da escritora britânica Virginia Woolf.

* "Disney não pagou nada ao plagiar", diz Schiffrin. Folha de S. Paulo, São Paulo, 9 out. 2011, Caderno Ilustríssima, p. 4-5

** ZAID, Gabriel. Livros demais!: sobre ler, escrever e publicar. São Paulo, Summus, 2004 [tradução de Felipe Lindoso]

BG de Hoje

O termo paperback, empregado por André Schiffrin e citado acima, fez-me lembrar imediatamente da canção Paperback writer, uma das minha preferidas no vasto repertório dos BEATLES. No vídeo abaixo, o quarteto tocando-a numa apresentação no Japão.