domingo, 12 de dezembro de 2010

Facebook: entre a "bagaça" e o "papo-cabeça"



"Olha, quando um cara acha tudo muito bom, ele é que não presta".
Millôr Fernandes

"Nunca conheci quem tivesse levado porrada
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo".

Fernando Pessoa/Álvaro de Campos no Poema em linha reta


As chamadas redes sociais (sites de relacionamento) vieram para ficar (goste-se ou não delas). Algumas, nada populares (Sonico, Hi-5 e outras), provavelmente serão desativadas num futuro próximo ou incorporadas a outras. Veja o caso do MySpace: há pouco firmou parceria com o Facebook, uma vez que vem perdendo usuários globalmente. E por falar em Facebook, que "lugar" interessante para observar o comportamento das pessoas, através dos perfis que lá mantêm.

Em setembro, Contardo Calligaris* (colunista que, ao lado de Tostão, não posso deixar de ler) relatou o que ocorre com sua (dele) amiga. Ao chegar em casa, ela abre o laptop na cama para curtir sua fossa vendo a felicidade dos conhecidos exposta no Facebook:

"Minha amiga - escreve Calligaris - , em suma, sente-se excluída da felicidade geral da nação facebookiana: só ela não foi promovida, não encontrou um namorado fabuloso, não mudou de casa, não ganhou nesta rodada da loto. É mesmo um bom jeito de aprofundar e curtir a fossa: a sensação de um privilégio negativo, pelo qual nós seríamos os únicos a sofrer, enquanto o resto do mundo se diverte".

Mas a amiga acaba se dando conta de que sua página não é diferente das outras: também exibe fotos felizes e notas amenas e alegrinhas e quem passasse por lá acharia que ela tem uma vida ótima. Calligaris, então, nos lembra que a infelicidade nem sempre é um problema:

"Por exemplo, a infelicidade é uma das motivações essenciais; sem ela nos empurrando, provavelmente, ficaríamos parados no tempo, no espaço e na vida. Ou ainda, a infelicidade é indissociável da razão e da memória, pois a razão nos repete que a significação de nossa existência só pode ser ilusória e a memória não para de fazer comparações desvantajosas entre o que alcançamos e o que desejávamos inicialmente".

No Facebook todo mundo tenta parecer feliz e de bem com a vida, mesmo que, na realidade, não seja bem assim. Todo mundo é "engraçadinho" e virtuoso, além, é claro, daqueles carentes virtuais (já falei deles aqui) que entopem a rede com futilidades e, no fundo, querem apenas gritar: "Ei, estou aqui! Lembrem-se de mim! Eu sou legal". Por que tantos querem impingir aos outros essa imagem de "felicidade total"? Calligaris dá uma magistral resposta:

"[...] somos cronicamente dependentes do olhar dos outros. Consequência: para ter certeza de que sou feliz, preciso constatar que os outros enxergam minha felicidade. Nada grave, mas isso leva a algo mais chato: a prova de minha felicidade é a inveja dos outros. O resultado dessa necessidade de parecermos felizes é que a felicidade é este paradoxo: uma grande impostura da qual receamos não fazer parte e que, por isso mesmo, não conseguimos denunciar".

Não quero dar uma de "fodão". Que fique claro o seguinte: também estou no Facebook para me divertir a maior parte do tempo. E  se, de vez em quando, tento incluir alguma coisa mais "papo-cabeça" é porque tenho o péssimo (e inútil) hábito de me levar a sério - mais uma imagem (possivelmente falsa e certamente patética) que tento apresentar aos outros. Mas nem por isso deixo de me incomodar com o excesso de "bagaça" que encontro diariamente naquela rede social.

P. S. Vale a pena também ler o que escreveu Adelaide Amorim, alguns meses atrás, sobre o Facebook (clique aqui).
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* CALLIGARIS, Contardo. Felicidade nas telas. Folha de S. Paulo, São Paulo, 23 set. 2010, p. 11 (Caderno Ilustrada)


BG de Hoje

O LED ZEPPELIN talvez seja o grupo de rock com mais álbuns incluídos nas listas dos melhores ou dos maiores discos do gênero em todos os tempos. Nada mais justo, penso eu. Porém, Houses Of The Holy (1973) dificilmente entra nessas relações. Álbum variegado, flerta com ritmos e levadas incomuns ao som que até então caracterizava a banda. Qualquer dia dedico uma postagem exclusiva para esse trabalho. Por enquanto, vai aqui Over The Hills And Far Away, canção marcante de Houses Of The Holy.