MOMENTO NUM CAFÉ
Quando o enterro passou
Os homens que se achavam no café
tiraram o chapéu maquinalmente
Saudavam o morto distraídos
Estavam todos voltados para a vida
Absortos na vida
Confiantes na vida.
Um, no entanto, se descobriu num gesto largo e demorado
Olhando o esquife longamente
Este sabia que a vida é uma agitação feroz e sem finalidade
Que a vida é traição
E saudava a matéria que passava
Liberta para sempre da alma extinta *.
* BANDEIRA, Manuel. Momento num café. In: __________. Estrela da vida inteira. 20 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993. p. 155 [esse poema foi originalmente publicado no livro Estrela da manhã, de 1936] Os grifos na segunda estrofe são meus.