sábado, 19 de junho de 2010

Jogando água no chope da virtualidade (7)



Foi considerada espantosa, por muitos ouvintes de música pop, a declaração feita há alguns meses pelo guitarrista Jack White. Pessoalmente, não vi nada de mais. Reproduzida em vários veículos de comunicação (aqui, por exemplo), a opinião do músico fez lembrar, para alguns, a "batalha" do Metallica, anos atrás, contra o Napster. White, entre outras coisas, disse:

"Na minha cabeça continuo trabalhando como se não houvesse Internet. A ferramenta é um estorvo, é a grande inimiga da música atualmente".

Não custa lembrar que, no combate ao Napster, a banda californiana foi duramente acusada de defender os lucros gigantes da indústria fonográfica em detrimento dos interesses dos fãs - o que é parcialmente verdade. A declaração de Jack White parece estranha porque ele pertence a outra geração de artistas - mais jovem que os integrantes do Metallica -, que já estaria adaptada s "facilidades" proporcionadas pelo meio digital-virtual da música.

Mas penso que a crítica do guitarrista se refere principalmente ao turbilhão de dados e estímulos circulando a todo o tempo no ciberespaço. Tal circulação e tal quantidade de informação não são, em si, ruins; pelo contrário até. A questão, porém, é outra: como distinguir o que é essencial, relevante, em meio a este dilúvio (para usar a metáfora de Pierre Lévy)?

Creio que esta série - longa e chata, reconheço - chega a seu fim sem ter conseguido analisar, de forma sensata, o entusiasmo acrítico - muitas vezes ridiculamente infantil - em torno da virtualidade. Paciência. Também não pude discutir o "novo universal sem totalidade", tema fundamental do livro Cibercultura. Mas como, em outras oportunidades, tratarei do tema educação no contexto da era virtual, obrigatoriamente, lidarei com esse conceito.

Para encerrar, reproduzo abaixo crônica de Carlos Heitor Cony (Folha de S. Paulo, 20/05/10, p. 2), cujo teor tem tudo a ver como os argumentos aqui defendidos durante a série.

"A INTERNET E A RODA

Continuo indeciso diante do universo virtual, notadamente do tipo de comunicação instantânea e barata que a Internet nos dá. Evidente que dela me beneficio, tal como me beneficiei do computador.

Passei mais de 20 anos sem escrever ficção porque não suportava a máquina de escrever, mesmo aquelas que se diziam eletrônicas. O computador abriu um mundo para mim - se é que o meu umbigo é a coisa mais importante do universo. Pessoalmente, acho que é.

Embora me utilize da Internet diariamente, continuo achando que ela é poluidora, não no sentido ecológico, mas espiritual. Dá informações demais, excessivas, inúteis e redundantes. Mesmo a comunicação por e-mail, que aboliu o fax, o telegrama e a carta postal, transformou-se numa correspondência cultural e afetiva maciça, e nem sempre sincera, refletida e consciente.

A facilidade dos desabafos, das confissões, até mesmo da expressão dos sentimentos, protegidos por códigos secretos e relativo anonimato, cria um universo que pode ser duplamente virtual, na forma tecnológica da expressão eletrônica e no conteúdo que deságua no faz de conta da fantasia.

Não há segurança, nem moral nem material, no universo eletrônico. Ele é, sem dúvida, a ferramenta mais importante inventada pelo homem depois da roda. Mas é um instrumento, nada mais do que isso.

Como a roda, a informática está gerando uma nova civilização. É o início de nova era, além e acima do admirável mundo novo, que já está defasado. De seis em seis meses, o mundo novo se torna mais admirável e complexo, diluindo responsabilidades e anulando o indivíduo, que nada tem de admirável, mas lamentável. Como a roda, a Internet apenas nos facilita o caminho. Mas não nos aponta um destino".

BG de Hoje

Já que falei em Jack White, nada melhor do que ouvir WHITE STRIPES. A canção escolhida é meio óbvia (Seven Nation Army), mas é porque ela abre um dos meus discos prediletos: Elephant (2003). Emprestei esse álbum a um amigo, três anos atrás, que, infelizmente, até hoje não me devolveu. P., SE VOCÊ ESTÁ LENDO ESTE TEXTO, POR FAVOR, DEVOLVA O MEU CD!