quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Sobre best-sellers (2)

O cidadão do mundo Roy Frenkiel, do blog Não leiam este blog, lá da Flórida envia a sua contribuição:

"Formado em comunicação de massas e leitor assíduo do New York Times, para mim um best-seller nada mais é do que a própria palavra indica: um dos livros de maior número de vendas em um dado período.

Um exemplo é mais ou menos o que encontramos no jornal de hoje, dia 19 de outubro de 2009: Dan Brown, autor do
Código Da Vinci, tem seu livro The lost symbol (O símbolo perdido) em primeiro lugar da lista do jornal. Outros livros similares, de puro entretenimento, vêm de autores e autoras como Charlaine Harris, Kathryn Sockett, Robert B. Parker e outros, mais ou menos com o mesmo estilo.

Um best-seller de ficção é o único que tem chances de obedecer a critérios mais artísticos da literatura, enquanto a maioria desses é de livros de autoajuda, política e biografias gerais. Em nenhum instante um best-seller se equivale, necessariamente, a um classic, ou clássico da literatura".

Há alguns aspectos óbvios ligados ao mercado editorial que são constantemente esquecidos pelo público em geral. Roy, oportunamente, nos lembra que a principal característica de um best-seller é seu desempenho nas vendas.

. . . . .

Neste trecho, faço um adendo: quero também lembrar algo frequentemente esquecido ou negligenciado, dependendo da "postura" do leitor em sua relação com a arte literária e suas preferências estéticas: livros, enquanto objetos - e ainda mais num mundo majoritariamente capitalista -, são mercadorias, produtos.

Gabriel Zaid * (de cujo livro já falei aqui) é incisivo:

"Nós gostaríamos de acreditar que cultura e comércio não têm nada que ver um com o outro: que a cultura circula e é adquirida por meios não comerciais próximos do culto e do oculto; que é como uma poção iniciatória dada aos escolhidos; que é algo adquirido gradualmente, sob o controle e com a garantia do Establishment".

Escamotear a dimensão comercial da circulação de bens culturais do campo editorial (para me expressar à la Bourdieu) é contribuir para a sacralização hipócrita dos livros. Mais uma vez, Gabriel Zaid:

"Note-se também a ambivalência ou duplicidade com a qual o sucesso (exotérico, externo, comercial) é desejado e temido nos círculos culturais, e a importância de ganhar o respeito de um pequeno grupo em detrimento do grande público. Ignorar esse público é, em última instância, a verdadeira negação da cultura: fracassar na comunicação, mas também salvar-se da perdição do comércio e do sucesso, uma garantia de pureza. O sucesso comercial pode ser contraproducente, provocando uma perda de credibilidade nos melhores círculos. Queremos que os livros sejam objetos democráticos, para ser lidos por todos, estar acessíveis em todos os lugares, mas também queremos que continuem sendo sagrados".
. . . . . .

Mas, ao estabelecer a comparação do tipo de publicação de que estamos tratando - os best-sellers - com outros produtos do campo editorial, Roy Frenkiel nos fornece grande ajuda para formular a seguinte pergunta: seria o best-seller um novo "gênero"?

Sandra Reimão ** considera que "a expressão best-seller, aplicada a livros e a literatura, comporta dois campos de significação, nem sempre coincidentes". Para a autora:

"A primeira significação da expressão, em sua acepção mais literal, diz respeito ao comportamento de vendas de um livro em um determinado mercado editorial. Best-sellers indica aqui os livros mais vendidos de um período em um local. Nesse sentido é uma expressão quantitativa e comparativa, e que diz respeito a vendas.
[...]
Ao lado da acepção ligada às vendas no mercado editorial, a expressão best-seller, quando aplicada à literatura de ficção, passou a designar também, por extensão, um tipo de texto - características internas, imanentes, de um tipo de narrativa ficcional.

Muitos autores, de tendências e pressupostos variados, buscaram elucidar quais seriam as características que fariam de um texto ficcional, um texto de literatura best-seller - também chamada de paraliteratura, literatura trivial, subliteratura, literatura de entretenimento, de massa ou de mercado".

Faço outra pergunta: existiriam marcas formais - elementos textuais verificáveis - que seriam índices seguros para determinar que um texto é potencialmente um best-seller, antes mesmo da sua circulação no circuito comercial (circuito este que envolve a atuação e interferência de diferentes agentes)?

Na próxima postagem, a participação da Milena.

* ZAID, Gabriel. Livros demais!: sobre ler, escrever e publicar. São Paulo: Summus, 2004 (tradução de Felipe Lindoso)
** REIMÃO, Sandra. Mercado editorial brasileiro: 1960-1990. São Paulo: Com-Arte/Fapesp, 1996