terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Sobre best-sellers (1)


Iniciaria esta série de postagens de outra maneira. Mas uma ocorrência imprevista alterou o rumo e a forma do(s) textos(s).

No domingo, abro a caixa do correio e encontro um exemplar da revista Veja destinado a mim. Hoje em dia, a maioria das pessoas um pouquinho mais bem informadas deixou de levar a sério essa publicação, marcada, nos últimos anos, pelo jornalismo tendencioso e de qualidade, no mínimo, duvidosa.

Não solicitei nenhuma assinatura da revista. Acredito que, por ter sido consumidor de outros produtos do grupo Abril - Superinteressante Playboy, mais recentemente; a extinta Showbizz, anos atrás - , a empresa resolveu mandar-me uma cortesia, tentando recuperar o antigo cliente. Isso mostra o quanto está abalado o mercado da mídia impressa, já que eu devo ser apenas um dos milhares em todo o país a receber esses exemplares "amostra grátis". Tal estratégia tem um custo, obviamente. E não é pequeno, suponho.

O curioso é que a matéria de capa trata dos livros de autoajuda, uma das vertentes mais lucrativas da indústria editorial. Entre os chamados best-sellers, desde o final dos anos 1980, a autoajuda é responsável por alguns dos títulos mais rentáveis.

Para tratar de assunto tão controverso - os best-sellers e sua relação com os leitores - decidi convidar outros blogueiros, diletos companheiros e companheiras, para dividir com eles e elas as postagens que antecederão as férias do Sinistras Bibliotecas. O primeiro a contribuir será o jornalista Jens, do divertidíssimo blog A toca do Lobo.

Escreve ele:

"Defino best-seller como aquelas obras arrasa-quarteirão que dominam por meses as listas de livros mais vendidos e, na falta de ideia melhor, se constituem no presente ideal por ocasião do Natal.

Não sei dizer o que determina que um livro assuma a condição de best-seller, mas creio que uma das razões principais, acima da popularidade do autor, está um competente trabalho de mídia do editor. É o que explica, por exemplo, o surgimento de um Dan Brown, até recentemente, um desconhecido entre nós, e a febre literária que acomete legiões infanto-juvenis a cada lançamento da série Harry Potter. 

Também julgo que, para qualificar-se a este posto, a obra deve ter enredo cativante e uma linguagem acessível ao maior número de leitores possível, como 
O Alquimista, de Paulo Coelho (que, a propósito, não li) ou os livros de crônicas e histórias curtas de Luis Fernando Veríssimo. Há, claro, exceções, como prova O nome da rosa, de Umberto Eco. 

Não avalizo a ideia de que um 
best-seller seja necessariamente um obra superficial. Além do já citado livro de Eco, lembro de A fogueira das vaidades, de Tom Wolfe, uma leitura que muito me agradou".

Há bastante para se pensar a partir das afirmações feitas pelo Jens, mas gostaria de destacar dois pontos: as listas de livros mais vendidos e o papel dos editores.

Na matéria do já citado número da Veja *, as jornalistas Isabela Boscov e Silvia Rogar observam que "uma olhada na lista dos livros mais vendidos de VEJA revela que aqueles que os leitores entendem com fonte de inspiração estão espalhados por todas as categorias - a ficção, como o caso de A cabana, , a não-ficção, como Comer, rezar, amar e a autoajuda propriamente dita, como em O monge e o executivo".

De fato, na tradicional lista da VejaA cabana é o segundo mais vendido no segmento ficção (é superado por O símbolo perdido, de Dan Brown). NOTA: nessa lista pode-se ver que simplesmente cinco (!) livros de Stephenie Meyer estão entre os dez mais vendidos. Os outros postos são ocupados por Caim, de José Saramago e por dois livros de L. J. Smith, que seguem o filão de Crepúsculo Lua Nova. Na categoria não-ficçãoComer, rezar, amar lidera e, no caso de autoajuda e esoterismo, O monge e o executivo até hoje ocupa lugar no topo (é o segundo colocado).

Segundo a matéria da VejaA cabana, do canadense William Paul Young, vendeu 13 milhões de exemplares (1,4 milhão no Brasil); Comer, rezar, amar, da norte-americana Elizabeth Gilbert, vendeu 8 milhões de unidades (300.000 no país); e O monge e o executivo, do também norte-americano James Hunter, chegou a 6 milhões (2,5 milhões só por aqui).

Não quero, no momento, fazer juízos de valor sobre a qualidade dos livros de autoajuda, mas gostaria de inserir aqui uma opinião surpreendente do editor Luiz Schwarcz (Companhia das Letras), dada em uma esntrevista publicada em 1994, na revista Istoé **"Costumo dizer que todo bom livro é de autoajuda, só que uns têm uma pretensão mais totalitária sobre a vida das pessoas ou mais imediatista".

E por falar em editor, Jens chama atenção para algo importante: o surgimento de best-sellers depende muito mais da capacidade de efetuar um marketing bem-feito, por parte das casas editoriais, do que das supostas qualidades dos escritores. E é interessante que Jens cite Dan Brown e lembre Umberto Eco. Em entrevista recente na Folha de S. Paulo, Eco, de forma irônica, declarou que Brown era uma "cria" dele...

Há diversas outras questões ainda a serem discutidas. Permanceço no tema na próxima postagem, desta vez com a contribuição de Roy Frenkiel. Inté.

* Nas asas da autoajuda. Revista Veja, São Paulo, ano 42, n. 48, edição 2142, p. 140-147. dez. 2009

** O Brasil quer ler. Revista Isto é, São Paulo, edição 1309, p. 5-7, nov. 1994

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