O professor Marcelo F. Carvalho,
além de ser um generoso divulgador do trabalho de outros blogueiros,
sempre lança ótimos questionamentos no seu Resumo da chuva.
Em relação ao tema desta série, Marcelo trata da moda e dos modismos:
"O que é a moda e onde isso nos leva? Bem, não é sobre a moda e seu pequeno-inútil universo que, por meio deste, dirijo-me. Mas debruçarei nela para responder à instigação do professor Halem.
Você usa uma calça jeans surrada (rasgada mesmo), camisa desbotada, com as costuras invertidas (puídas quase sempre) e aqueles tênis de lona que, no calor, produzem calos nos pés, apesar de existirem calçados altamente sofisticados e tecnologicamente confortáveis. Você coloca um boné de tela (daqueles que os caminhoneiros norte-americanos usam). Hoje em dia, estar com a barba por fazer dá aspecto de masculinidade e todos os modelos mostram os rostos impregnados de fiapos. Os cabelos? Bem, esses, nos homens, cresceram verticalmente, estilo black power anos 70 ou coqueiro.
Mas o que quero com toda essa descrição? Primeiramente dizer que se usarmos o que acabo de escrever, respeitando os escravos do modismo, gastaremos algo em torno de um salário mínimo (talvez dois!) e estaremos parecidos com os mendigos que cruzo diariamente pelas ruas da cidade. Qual é o nome da moda que usamos? Moda Mendigão! E devo admitir que uso vários desses itens descritos.
Pois assim são os best-sellers. Todos compram, devoram, dizem que adoram, mas, no fundo, não passam de um lixão. Raríssimas exceções, todo best-seller é puro lixo. Assim como as nossas calças jeans atuais".
Em conversas com adolescentes e jovens, costumo perceber que muitos deles não são assim tão refratários à leitura. Mas é possível notar que muitas de suas escolhas do que ler estão ligadas a dois fatores: 1) a projeção da publicação nas diversas mídias; 2) os títulos que são lidos pelos amigos e amigas são mais procurados do que aqueles recomendados por pais ou professores, por exemplo. Logicamente, não quero com esses bate-papos informais estabelecer uma opinião segura e fundamentada dos hábitos e formas de leitura dos adolescentes e jovens. Mas quero afirmar que a sociologia da leitura tem uma tarefa importante a fazer, no que se refere aos estudos das práticas de leitura nesse ambiente cultural globalizado em que estamos inseridos.
A esse respeito, Ruy Castro escreveu um pequeno artigo (ótimo!) cujo nome é, apropriadamente, Mega-sellers *. Segundo o articulista:
"O fenômeno se dá na área dos romances, poupando as biografias, as memórias e os livros de história, que, por enquanto, só têm de competir com best-sellers sobre cachorros".
Castro observa que essas publicações não são exclusividade dos norte-americanos mas precisam antes passar pelo mercado dos Estados Unidos para depois ocuparem as listas de mais vendidos de todo o mundo. Em qualquer lugar do planeta, são estes títulos que decoram as vitrines das livrarias. Quais as consequências disso? Castro responde parcialmente:
"Como os ' mega-sellers ' são maciçamente estrangeiros, teme-se que as editoras brasileiras desistam de apostar no humilde romance nacional - afinal, para que se arriscar a ter 3.000 livros encalhados quando se pode vender 600 mil? Pior ainda será se nossos romancistas tentarem se adaptar ao figurino australiano ou afegão para escrever, na esperança de que assim serão publicados e venderão livros".
Os livros da moda, mais do que movimentar milhões de dólares, colaboram com a nefanda uniformização da cultura escrita, esvaziando a arte de seu significado mais produndo, asfixiando a pluralidade dos modos de expressão literária e provocando a padronização dos gostos estéticos, tão prejudicial para a renovação das manifestações artísticas.
Na última postagem da série - e do ano - a contribuição especialíssima de Dade Amorim.
* CASTRO, Ruy. Mega-sellers. Folha de S. Paulo, São Paulo, p. A2, 9 mar 2009 (Caderno Brasil)
Em relação ao tema desta série, Marcelo trata da moda e dos modismos:
"O que é a moda e onde isso nos leva? Bem, não é sobre a moda e seu pequeno-inútil universo que, por meio deste, dirijo-me. Mas debruçarei nela para responder à instigação do professor Halem.
Você usa uma calça jeans surrada (rasgada mesmo), camisa desbotada, com as costuras invertidas (puídas quase sempre) e aqueles tênis de lona que, no calor, produzem calos nos pés, apesar de existirem calçados altamente sofisticados e tecnologicamente confortáveis. Você coloca um boné de tela (daqueles que os caminhoneiros norte-americanos usam). Hoje em dia, estar com a barba por fazer dá aspecto de masculinidade e todos os modelos mostram os rostos impregnados de fiapos. Os cabelos? Bem, esses, nos homens, cresceram verticalmente, estilo black power anos 70 ou coqueiro.
Mas o que quero com toda essa descrição? Primeiramente dizer que se usarmos o que acabo de escrever, respeitando os escravos do modismo, gastaremos algo em torno de um salário mínimo (talvez dois!) e estaremos parecidos com os mendigos que cruzo diariamente pelas ruas da cidade. Qual é o nome da moda que usamos? Moda Mendigão! E devo admitir que uso vários desses itens descritos.
Pois assim são os best-sellers. Todos compram, devoram, dizem que adoram, mas, no fundo, não passam de um lixão. Raríssimas exceções, todo best-seller é puro lixo. Assim como as nossas calças jeans atuais".
Em conversas com adolescentes e jovens, costumo perceber que muitos deles não são assim tão refratários à leitura. Mas é possível notar que muitas de suas escolhas do que ler estão ligadas a dois fatores: 1) a projeção da publicação nas diversas mídias; 2) os títulos que são lidos pelos amigos e amigas são mais procurados do que aqueles recomendados por pais ou professores, por exemplo. Logicamente, não quero com esses bate-papos informais estabelecer uma opinião segura e fundamentada dos hábitos e formas de leitura dos adolescentes e jovens. Mas quero afirmar que a sociologia da leitura tem uma tarefa importante a fazer, no que se refere aos estudos das práticas de leitura nesse ambiente cultural globalizado em que estamos inseridos.
A esse respeito, Ruy Castro escreveu um pequeno artigo (ótimo!) cujo nome é, apropriadamente, Mega-sellers *. Segundo o articulista:
"O fenômeno se dá na área dos romances, poupando as biografias, as memórias e os livros de história, que, por enquanto, só têm de competir com best-sellers sobre cachorros".
Castro observa que essas publicações não são exclusividade dos norte-americanos mas precisam antes passar pelo mercado dos Estados Unidos para depois ocuparem as listas de mais vendidos de todo o mundo. Em qualquer lugar do planeta, são estes títulos que decoram as vitrines das livrarias. Quais as consequências disso? Castro responde parcialmente:
"Como os ' mega-sellers ' são maciçamente estrangeiros, teme-se que as editoras brasileiras desistam de apostar no humilde romance nacional - afinal, para que se arriscar a ter 3.000 livros encalhados quando se pode vender 600 mil? Pior ainda será se nossos romancistas tentarem se adaptar ao figurino australiano ou afegão para escrever, na esperança de que assim serão publicados e venderão livros".
Os livros da moda, mais do que movimentar milhões de dólares, colaboram com a nefanda uniformização da cultura escrita, esvaziando a arte de seu significado mais produndo, asfixiando a pluralidade dos modos de expressão literária e provocando a padronização dos gostos estéticos, tão prejudicial para a renovação das manifestações artísticas.
Na última postagem da série - e do ano - a contribuição especialíssima de Dade Amorim.
* CASTRO, Ruy. Mega-sellers. Folha de S. Paulo, São Paulo, p. A2, 9 mar 2009 (Caderno Brasil)
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