O jornalista (com "J" maiúsculo) Pirata Z, (agora também Z ninguém), do blog O lado Z, nos manda sua contribuição para o debate:
"
como revisor ou copy desk, trabalhei muito tempo nas mais variadas
editoras, das mais chulés às mais consolidadas, comercialmente, e
confesso: não sei o porquê de um determinado livro tornar-se um
melhor-vendido. há, no entanto, um ponto óbvio: essas editoras
trabalham com pesquisas qualitativas (sic), para poderem apurar o que é
que as gentes andam querendo ler. isso feito, das duas, uma: ou lhes
cai às mãos uma obra que o autor, por sorte, ou por igual atenção ao
que dizem as gentes, criou com elementos que correspondem aos anseios
do público, e o resto fica a critério dos marqueteiros da editora, ou
mesmo, e já testemunhei isso, as editoras encomendam uma obra assim a determinado autor, e o resto fica a critério dos marqueteiros da editora...
seja lá qual for o caso, mimético, o ser humano passa a repetir os "mantras" que os marqueteiros, com equacionados press releases, alardeiam nos mais diversos veículos midiáticos, e dá-se, então, o que chamam de ' propaganda boca a boca ', e o resto é história - e, claro, grana no caixa.
não
creio que o melhor-vendido tenha seu sucesso vinculado ao acaso, pois
isso me obrigaria a preterir a lógica em favor do absurdo, acreditando
que, um dia, alguém, em algum lugar do planeta, se interessou pela
história de um pirralho afegão chegado a soltar pipas, contou isso pra
algumas pessoas de seu círculo de convívio, as quais fizeram o mesmo, a
coisa rompeu fronteiras geográficas, ideológicas e humanas as mais
diversas, e bum! nasceu mais um sucesso...
Chaplin dizia o seguinte: "Entender o mundo em que se vive. Eis o segredo do sucesso".
O
mundo, não de hoje, tornou-se pateticamente óbvio - e viva o
uniformizante neoliberalismo! - o que, acho, explica o sucesso desse
tipo de negócio.
Tudo
isso pra dizer o seguinte: o melhor-vendido é/sempre foi, para mim, um
excelente negócio para todos os envolvidos. o autor, além de um bom
tutu, ganha fama e prestígio; a editora consegue o que a lógica
mercadológica impõe, que é um retorno inversamente proporcional ao
bocadinho investido, e, por fim, o público ganha gotinhas do remédio
que precisa para a angústia da vez, criada, sabemos, pelo universo
mesmo que o "farmacêutico" representa...
final feliz é isso aí, né não?"
final feliz é isso aí, né não?"
Pirata Z, de forma cristalina, evidencia o caráter - por favor, não nos esqueçamos disso - comercial da empreitada editorial.
Recentemente, li uma dissertação de mestrado*
na qual a pesquisadora, entre outros pontos, analisa o papel das
editoras com relação à formação de um público leitor. Discutindo a
atuação de Giulio Einaudi (célebre editor italiano), Maria da Conceição
Carvalho procura distinguir os diferentes projetos editoriais: a Editora-Sim e a Editora-Não.
"A ' Editora-Sim ', na visão crítica de Einaudi, ao invés de ir ao encontro do gosto do público. gosto tornado a priori
pela indústria cultural, como já denunciava Adorno, introduz no
panorama cultural as novas tendências de cada campo - literário,
artístico, científico, histórico e social - e trabalha no sentido de
fazer emergir os interesses mais profundos, mesmo que se vá contra a
corrente. Desconsiderando o interesse epidérmico e as expressões mais
superficiais e efêmeras do ' grande público ' a ' Editora-Sim ' se
compromete, ao contrário, com a formação de um gosto duradouro. Por
esta via forma-se também um público e, por que não, um mercado. A '
Editora-Sim ', pensa Eunaudi, é fruto de um projeto, de um critério
orientador, de uma ideia clara daquilo que se deseja fazer desde o
início. O que, entretanto, é bem diferente da ideia obsessiva de se ter
um projeto, dentro do qual, por vezes, não cabe a realidade".
De modo geral, as grandes editoras (e usando a classificação de Einaudi) são sempre ' Editoras-Não '. Estão saturadas de "realidade", de pragmatismo (cito o Pirata Z: "viva o uniformizante neoliberalismo"), e por isso, proliferam os best-sellers...