domingo, 7 de julho de 2019

10 anos de Besta Quadrada. O que há pra dizer?


Blogosfera... Alguém ainda usa essa palavra?

Em 2005, quando inciei minha experiência com blogs (através do extinto Ração das Letras), o termo não só era largamente utilizado, como ainda respondia por boa parte da interação buscada pelos diversos perfis "soltos" na rede, além de representar satisfatoriamente, naquela época, o fetiche do "conteúdo produzido pelo próprio usuário", elementos incrementados (e valorizados) a partir da chegada daquilo que se convencionou chamar de Web 2.0.

Escrevia-se ou exibiam-se fotos/vídeos de curta duração. Outros perfis faziam comentários (em geral, respeitosos e civilizados e, por isso, respondidos por quem mantinha o blog). O negócio era bem simples, sem a necessidade de criar (e pagar) por um domínio/website específico. Os mais populares costumavam gerar muitos comentários. Sujeitos insignificantes (como este que vos escreve), bem como jornalistas, acadêmicos/as, escritores/as, artistas em geral - muita gente via a parada com bons olhos. Havia blogs de culinária e moda; de divulgação científica e sobre fotografia; espaços de denúncia e de reportagem independente; narrativas ficcionais e produção de poesia, entre outros. E, naturalmente, ao lado de trabalhos excelentes, circulava também muita porcaria.

Mídias sociais já faziam parte do cotidiano em 2005: o Orkut era uma febre (pelo menos no Brasil) e o MySpace acabava de dar as caras (falando assim, parece que foi tudo numa era distaaaante...). Entretanto, nenhum destes conseguiu canibalizar a blogosfera. Essa tarefa seria executada por tudo aquilo que veio depois - Facebook, Twitter, Youtube, WhatsApp e Instagram. NOTA: Espero que o(a) eventual leitor(a) não me entenda mal. Não estou colocando a pecha de "vilão" em nenhum desses aplicativos/mídias sociais. As mudanças tecnológicas nesse campo têm sido vertiginosas, numa trajetória praticamente impossível de alterar (ou de deter, caso se deseje fazê-lo). Quando falo em canibalização, quero apenas ressaltar que Facebook, Twitter, Youtube, WhatsApp e Instagram, de modos diferentes e às vezes complementares, não só incorporaram os recursos existentes nos blogs, como foram muito além, em matéria de interatividade e veiculação de conteúdo, tornando estes obsoletos. Assim opera a tecnologia, ainda mais quando há corporações e perspectivas de lucro permeando e conduzindo o processo.

Claro, os blogs ainda estão por aí. Muitos deles, porém, atrelam-se a portais mantidos por conglomerados de entretenimento/jornalismo e funcionam quase como as tradicionais colunas dos veículos impressos, sem nada de muito singular, inovador ou atrativo. Talvez nem devessem ser chamados de blogs. Pouquíssimos dão atenção à seção de comentários. Seus autores e autoras são geralmente indivíduos cuja experiência profissional ou fama não derivou da blogosfera. E milhões de outros blogs, criados por amadores e diletantes, foram deixando de ser atualizados. De vez em quando alguém topa com um desses "cadáveres" internéticos.

Penso não ser exagero afirmar que os blogs estão fadados a desaparecer. Não obstante, o mundo vai continuar girando. As bolsas de valores não vão cair por causa disso nem lágrimas de desespero e angústia serão derramadas.

Então por que sinto uma aura de lamento e queixume envolvendo esta postagem ?

Bem... Pode não parecer, mas a minha atividade como blogueiro - com a qual, convém lembrar mais uma vez, não ganho nenhum centavo - é a coisa mais importante que faço. Desconfio também de que é a única coisa que não me deixa desmoronar, mentalmente falando.

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Há alguns meses, escrevi aqui que milhões e milhões de seres humanos, em todo o planeta, veem-se obrigados a realizar, quase diariamente, tarefas das quais não extraem qualquer satisfação ou alegria - e pior -, nem experimentam sentimentos de realização pessoal (sem mencionar que muitas dessas tarefas resultam em muito cansaço físico e/ou esgotamento mental). Embora admita ser um privilegiado por meu emprego não envolver incumbências penosas nem degradação, estou, como a maioria dos indivíduos, atolado até a alma no pantanal da semi-compulsoriedade alienante do trabalho que é impingida a enormes contingentes da população nas sociedades capitalistas.

Não, definitivamente, meu emprego não tem qualquer relevância. Nem social, nem pessoal. Dependo dele para poder sobreviver, contudo, e não posso simplesmente abandoná-lo, a despeito de não me trazer nenhum contentamento.

Talvez devesse então tentar encontrar alento emocional e psíquico na família, nos amigos ou, quem sabe, em potenciais relacionamentos "amorosos", certo?

Errado.

Meu irmão e minhas irmãs nunca me abandonaram. Pelo contrário: se não fosse por eles nem sei onde estaria hoje. Por isso sempre terão minha gratidão, respeito e, quando precisarem, também auxílio. Todavia, nunca desenvolvemos vínculos afetivos fortes entre nós. É duro reconhecer isso, mas é a verdade.

Quanto às amizades, com toda a franqueza, inexistem. Se desejasse telefonar, neste momento, para qualquer um(a) a quem já considerei amigo(a), para combinarmos um simples bate-papo, não encontraria ninguém com disponibilidade. Teríamos que entrar naquele aflitivo jogo das desculpas-clichês que todos damos e ouvimos: "meu tempo tá uma loucura ultimamente!"; "vamos marcar pra outro dia?"... Há algo mais profundo também: nossas trajetórias existenciais tomaram rumos tão diferentes, nossas visões de mundo se modificaram tanto, que já não há possibilidade de compreensão mútua. Sem julgamentos, sem apontar dedos e imputar erros - são circunstâncias da vida. Nada resta a fazer senão aceitar.

Relacionamentos "amorosos" (ênfase nas aspas) são um tópico desagradável. Talvez fale disso noutra oportunidade. Ou, mais provavelmente, não.

O problema é que, infelizmente, assim como as outras pessoas, às vezes também sinto necessidade de me comunicar. Minha atividade blogueira remedia parte dessa necessidade, além de me trazer grande satisfação às vezes, quando avalio que consegui produzir um bom texto sobre um assunto de que gosto.

Tem sido assim desde o Ração das Letras, em 2005. Continuou com o Sinistras Bibliotecas, durante um curto espaço de tempo, entre 2007 e 2008. E prossegue agora, neste Besta Quadrada, que completou uma década em 2019.

Aqui neste espaço posso imaginar o interlocutor que gostaria de ter no mundo offline. Acabo falando sozinho, naturalmente, mas o(a) eventual leitor(a) não tem noção de como isso me faz bem.

É verdade que deixei de lado o Besta Quadrada neste ano. Meu expediente de serviço aumentou, as funções se modificaram, há uma enorme dificuldade de adaptação ao novo posto de trabalho. Não estou sabendo administrar meu tempo longe do emprego. Além disso, nunca me senti tão amofinado e apático como nos últimos meses. Tenho lido pouco - algo bastante prejudicial para minha atividade blogueira, baseada principalmente no relato de minhas impressões de leitura.

Não quero encerrar este blog, contudo. Tornou-se um espaço vital, indispensável para minha sanidade. Espero conseguir me equilibrar nos próximos dias, ao menos o suficiente para continuar falando sozinho por aqui.

Preciso disso. Desesperadamente.

Na próxima postagem, darei uma olhada num dos mais célebres contos de Machado de Assis, Teoria do medalhão.

Inté.
BG de Hoje

Se há um pessoal cujo som escapa das rotulações que costumamos aplicar a artistas pop é a banda norte-americana OZOMATLI. Num mesmo álbum, diferentes gêneros e subgêneros musicais comparecem (embora o hip-hop seja o grande referencial do grupo, temperado com a latinidade originária de seus membros) e, quase sempre, o resultado é excelente, como nesta faixa caracteristicamente funk, Magnolia Soul, presente no 4º disco lançado por eles, em 2007.

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