Antes de entrar propriamente no tema desta postagem, gostaria de lembrar duas excelentes professoras das quais fui aluno na época em que fazia o curso de Letras, nos anos 1990*.
Uma delas foi Maria Aparecida Andrés, que não pertencia à FALE/UFMG, mas ministrou a disciplina "Lógica do Pensamento Científico", componente do antigo "Ciclo Básico", obrigatório, ofertado na Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, da mesma universidade.
Era impressionante. Sem se levantar de sua cadeira durante quase toda a aula, fumando a maior parte do tempo (naquela época, um ato perfeitamente tolerável ainda), Aparecida Andrés conseguia amarrar, brilhantemente, as observações titubeantes e imprecisas que fazíamos aos textos dos autores lidos naqueles encontros (Adam Schaff, Karl Mannheim, Marilena Chauí, entre outros). Em certa ocasião, trocou o assunto que seria discutido para falarmos do (então) recente suicídio de Kurt Cobain, líder do Nirvana, sem, contudo, comprometer a (imensa) qualidade de sua aula. Dizia que preferia trabalhar com a graduação porque gostava - as palavras são dela - de "cabeças virgens"; ou seja, aquelas sem os "vícios" dos estudantes já ingressados no mestrado e/ou doutorado.
A outra foi Graça Paulino. Duas de minhas irmãs já haviam estudado com ela e muito a elogiavam; assim, foi com grande expectativa que me matriculei na disciplina "Teoria da Literatura I". Infelizmente, entretanto, só tive duas aulas. Trabalhadores do Brasil inteiro, naquela época - inclusive professores universitários - estavam muito preocupados com a reforma da previdência implementada no primeiro governo FHC, receosos de que os valores de suas aposentadorias fossem achatados ou de serem obrigados a continuar na ativa além do tempo inicialmente previsto. Foi o caso de Graça Paulino (e acho que também o de Aparecida Andrés), que decidiu aposentar-se justamente naquela oportunidade. Não sem antes, ainda bem, nos oferecer um pouco de sua sabedoria, discutindo conosco um dos mais belos poemas de Álvaro de Campos/Fernando Pessoa: Se te queres matar, por que não te queres matar?.
Só que Graça Paulino retornou à vida universitária, na condição de professora associada da Faculdade de Educação (UFMG) e integrante do Ceale (Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita), vinculado a essa unidade acadêmica. Recentemente, li entrevista sua publicada na (excelente) revista Presença Pedagógica** (publicação, aliás, da qual Paulino foi editora geral e atualmente compõe o conselho editorial). Na conversa, entre os assuntos tratados, chamou-me a atenção principalmente o que vai no trecho abaixo:
Era impressionante. Sem se levantar de sua cadeira durante quase toda a aula, fumando a maior parte do tempo (naquela época, um ato perfeitamente tolerável ainda), Aparecida Andrés conseguia amarrar, brilhantemente, as observações titubeantes e imprecisas que fazíamos aos textos dos autores lidos naqueles encontros (Adam Schaff, Karl Mannheim, Marilena Chauí, entre outros). Em certa ocasião, trocou o assunto que seria discutido para falarmos do (então) recente suicídio de Kurt Cobain, líder do Nirvana, sem, contudo, comprometer a (imensa) qualidade de sua aula. Dizia que preferia trabalhar com a graduação porque gostava - as palavras são dela - de "cabeças virgens"; ou seja, aquelas sem os "vícios" dos estudantes já ingressados no mestrado e/ou doutorado.
A outra foi Graça Paulino. Duas de minhas irmãs já haviam estudado com ela e muito a elogiavam; assim, foi com grande expectativa que me matriculei na disciplina "Teoria da Literatura I". Infelizmente, entretanto, só tive duas aulas. Trabalhadores do Brasil inteiro, naquela época - inclusive professores universitários - estavam muito preocupados com a reforma da previdência implementada no primeiro governo FHC, receosos de que os valores de suas aposentadorias fossem achatados ou de serem obrigados a continuar na ativa além do tempo inicialmente previsto. Foi o caso de Graça Paulino (e acho que também o de Aparecida Andrés), que decidiu aposentar-se justamente naquela oportunidade. Não sem antes, ainda bem, nos oferecer um pouco de sua sabedoria, discutindo conosco um dos mais belos poemas de Álvaro de Campos/Fernando Pessoa: Se te queres matar, por que não te queres matar?.
Só que Graça Paulino retornou à vida universitária, na condição de professora associada da Faculdade de Educação (UFMG) e integrante do Ceale (Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita), vinculado a essa unidade acadêmica. Recentemente, li entrevista sua publicada na (excelente) revista Presença Pedagógica** (publicação, aliás, da qual Paulino foi editora geral e atualmente compõe o conselho editorial). Na conversa, entre os assuntos tratados, chamou-me a atenção principalmente o que vai no trecho abaixo:
"Quanto ao papel dos intelectuais, professores universitários, acredito que primeiramente eles devem assumir a graduação, dedicar-se a esse nível de ensino. Tenho visto nas universidades públicas uma inversão. Quem se considera intelectual, professor de primeira linha, só quer dar aula para a pós-graduação e não para a graduação. Isso tem de mudar para que a graduação melhore e para que os alunos da licenciatura possam chegar às suas escolas de uma maneira diferente. Dessa forma, com professores bem formados, o diálogo entre universidade e escola básica pode melhorar muito. Na verdade, o que ocorre é que apenas a pesquisa é valorizada no currículo do professor universitário. Ganham-se bolsas de produtividade por pesquisa, mas não por aulas bem ministradas. Outro descaso que encontramos relaciona-se a projetos de extensão. Esses projetos, que fazem com que a universidade se insira na vida social da comunidade, não são valorizados. Nem o ensino nem a extensão são premiados, destacados, somente a pesquisa. Se a universidade está dividida em ensino, pesquisa e extensão, se são essas as três funções que temos de exercer, então que sejam exercidas com equilíbrio. Um pesquisador não deve ser mais valorizado do que um professor".
Considero a profissão de quem ensina exatamente isso: uma profissão. Nada a ver com "dom" ou "caminho vocacional". Mas para que essa missão seja bem realizada é preciso empenho (como, aliás, em qualquer outra atividade profissional). Isso, penso eu, vale tanto para a educação básica quanto para o ensino superior.
Alguns "professores" universitários - com pós-doc em não-sei-o-quê, com dezenas de artigos e livros publicados, mas incapazes de transmitir "a chama sagrada" (exagerei na imagem, né não?) a seus alunos - na minha opinião, são inadequadamente chamados de professores. Esses "alguns" ou são deslumbrados demais com sua própria trajetória ou são simples burocratas da docência.
* É claro que tive outros ótimos professores na FALE/UFMG - Hugo Mari, Sueli Pires, Murilo Marcondes de Moura, Jussara Santos, Antonio Orlando, Lúcia Castello Branco. Estou falando dessas duas porque estão mais diretamente relacionadas com o assunto da postagem.
** "Ainda não temos um Brasil literário, mas precisamos continuar lutando por isso". Presença Pedagógica, Belo Horizonte, v. 17, n. 102, nov./dez. 2011, p. 5-10
BG de Hoje
Não sou nem de longe um fã ardoroso, mas gosto muito de R.E.M. A primeira canção da banda que ouvi foi Orange Crush e que até hoje me agrada muito.