terça-feira, 27 de outubro de 2009

Nocautes - Introdução

Não consigo descartar a maioria dos livros que tenho, alguns bastante antigos, outros em edições de qualidade inferior. Mantenho-os nas estantes como um atestado de gratidão eterna. Por exemplo, o manual de teoria literária de Hênio Tavares *. Foi usado por minhas irmãs e hoje integra minha modestíssima coleção. Vou até ele em busca de um conceito para o termo conto. Encontro este:

"CONTO - É uma narrativa de menor brevidade. É como o chamou Lúcia Miguel Pereira no seu livro Machado de Assis, - ' o caso ' em contraposição ao romance, que é ' a vida '. Diz a segura ensaísta: ' o romance é a vida, o conto é o caso, a anedota ' ".

No Pequeno dicionário de termos literários **, de João José de Melo Franco (publicado 25 anos atrás), pode-se ler que:

"Na modernidade o conto se aproximou de um tema que depende de uma surpresa ligada ao cotidiano. Em geral é de pequeno tamanho, nunca se aproximando na extensão à novela e ao romance. Do ponto de vista dramático o conto é univalente: possui um só drama, um só conflito, uma história, uma unidade dramática, uma ação".

Mas também possuo livros mais recentes, ora essa! Lançado no ano passado, o Dicionário de gêneros textuais ***, de Sérgio Roberto Costa, além de chamar atenção para o tamanho do conto em relação a outras modalidades de narrativa, afirma que essa "característica de síntese" decorre de "suas origens socioculturais e circunstâncias pragmáticas". Para Costa, "socioculturalmente [...] o conto literário tem sua origem na cultura oral, enquanto o romance é regido pela cultura da escrita/leitura".

Por sua vez, Nadia Battella Gotlib (Teoria do conto****), refletindo sobre a passagem do conto oral para o escrito, observa que

" [...] esta voz que fala ou escreve só se afirma enquanto contista quando existe um resultado de ordem estética, ou seja, quando consegue construir um conto que ressalte os seus próprios valores enquanto conto, nesta que já é, a esta altura, a arte do conto, do conto literário. Por isso, nem todo contador de estórias é um contista".

Nesse pequeno livro de Gotlib, encontra-se também reproduzida a famosa - e maravilhosa - distinção feita por Julio Cortázar:

"Nesse combate que se trava entre um texto apaixonante e o leitor, o romance ganha sempre por pontos, enquanto que o conto deve ganhar por knock-out".

Péssimo leitor de contos, sempre preferi os romances. De todo modo, arrisco-me a escrever um pouco sobre os dez melhores contos brasileiros que já encontrei, as dez narrativas curtas que me nocauteiam sempre.

Perceber-se-á, imediatamente, ao olhar a lista abaixo, que a maioria integra as antologias mais populares do gênero. Não importa, prossigo mesmo assim...

Os dez nocautes:

1) Roupinha de marinheiro - Dalton Trevisan
2) Sorôco, sua mãe, sua filha - João Guimarães Rosa
3) O homem que sabia javanês - Lima Barreto
4) Feliz aniversário - Clarice Lispector
5) O cobrador - Rubem Fonseca
6) Pequenas distrações - Gregório Bacic
7) Onde andam os didangos? - José J. Veiga
8) O colocador de pronomes - Monteiro Lobato
9) Missa do Galo - Machado de Assis
10) A confissão de Leontina - Lygia Fagundes Telles

(OBSERVAÇÃO: Não se trata de um ranking)

Começo com Dalton Trevisan, na sexta-feira.

* TAVARES, Hênio. Teoria literária. 7 ed. Belo Horizonte: Itatiaia, 1981

** MELO FRANCO, João José de. Pequeno dicionário de termos literários. São Paulo: Três, 1984

*** COSTA, Sérgio Ribeiro. Dicionário de gêneros textuais. Belo Horizonte: Autêntica, 2008

**** GOTLIB, Nádia Battella. Teoria do conto. 3 ed. São Paulo: Ática, 1987


P. S
. Iria escrever sobre o livro A religação dos saberes, organizado por Edgar Morin, mas perdi a vontade. Fica pra outra.