segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Freud e a felicidade (3)


Em certa altura de O mal-estar na civilização*, escreve Freud:

"Em nenhum de meus trabalhos anteriores tive, tão forte quanto agora, a impressão de que o que estou escrevendo pertence ao conhecimento comum e de que estou desperdiçando papel e tinta, ao mesmo tempo que usando o trabalho e o material do tipógrafo e do impressor pra expor coisas que, na realidade, são evidentes por si mesmas".

Mas o fato é que esta impressão não demoveu o autor da intenção de escrevê-lo. O livro veio a público e as "obviedades" escritas nele motivaram (e motivam ainda) um bom debate.

Semanas atrás eu falei sobre alguns textos não-ficcionais de inigualável beleza, e que me interessam quase tanto quanto Literatura. Na ocasião, eu me referia a uma conferência de Max Weber, A ciência como vocação. Julgo que O mal-estar na civilização é da mesma categoria: simples e, no entanto, abrangente; resultado de acurada reflexão e, no entanto, imediatamente compreensível. E, não por acaso, os dois escritos estão sendo aqui discutidos porque tem muita coisa em comum.

Freud, tal com Weber, questiona-se: "Como foi que tantas pessoas vieram a assumir essa estranha atitude de hostilidade para com a civilização?". Sim, porque a civilização não "cumpre suas promessas" e frustra milhões de indivíduos, que "tomaram conhecimento do mecanismo das neuroses, que ameaçam solapar a pequena parcela de felicidade desfrutada pelos homens civilizados".

Coerente com as bases de sua construção teórica, o pensador austríaco afirma que

"[...] as frustrações da vida sexual são precisamente aquelas que as pessoas conhecidas como neuróticas não podem tolerar. O neurótico cria, em seus sintomas, satisfações substitutivas para si, e estas lhe causam sofrimento em si próprias, ou se lhe tornam fontes de sofrimento pela criação de dificuldades em seus relacionamentos com o meio ambiente e a sociedade a que pertence".

E quais seriam essas satisfações substitutivas?

Antes, convém observar que Freud não tinha um concepção muito favorável sobre os seres humanos:

"O elemento de verdade por trás disso tudo, elemento que as pessoas estão tão dispostas a repudiar, é que os homens não são criaturas gentis que desejam ser amadas e que, no máximo, podem defender-se quando atacadas: pelo contrário, são criaturas entre cujos dotes instintivos deve-se levar em conta uma poderosa quota de agressividade. Em resultado disso, o seu próximo é para eles, não apenas um ajudante potencial ou um objeto sexual, mas também alguém que os tenta a satisfazer sobre ele a sua agressividade, a explorar sua capacidade de trabalho sem compensação, utilizá-lo sexualmente sem o seu consentimento, apoderar-se de suas posses, humilhá-lo, causar-lhe sofrimento, torturá-lo e matá-lo. Homo homini lupus".

Na próxima - e última - postagem dessa série, falo sobre as tais satisfações substitutivas.
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FREUD, Sigmund. O mal-estar na civilização. São Paulo: Abril Cultural, 1978 (Coleção Os pensadores) [tradução de José Octávio de Aguiar Abreu]


CAMPEÃS DO GRAND PRIX

A Seleção Brasileira de Vôlei Feminino sagrou-se campeã (pela oitava vez) do Grand Prix, no Japão. É um título para a consolidação desse grupo como uma das melhores equipes - senão a melhor - do mundo. Paula Pequeno, recuperando-se de cirurgia, não estava lá. Mas na ausência desta, a belo-horizontina Sheilla (na imagem) foi mais uma vez decisiva (como havia sido em Pequim) e, com justiça, foi eleita a melhor jogadora do torneio. Destaque também para a jovem Natália, a mão mais pesada do nosso atual vôlei feminino. Final de 2009, começa a Superliga. E tem tudo para ser um dos melhores campeonatos dos últimos anos, já que todas as 14 jogadoras convocadas para o Grand Prix vão atuar em times nacionais nesta temporada.