O último CD que comprei foi no ano passado: Greatest Hits: Back to the Start, uma coletânea do Megadeth, lançada em 2005.
Estava num supermercado e avistei um display cheio de discos de artistas variados ao preço de R$ 9,90 cada um. Pensei: Por que não?
Eu sei. É estranho ler que alguém se dispôs a pagar por um CD há pouco mais de um ano, pois praticamente todo mundo neste milênio simplesmente baixa (de graça) na internet as músicas que quer ouvir - afinal, a obtenção de arquivos de música no formato MP3 (e outros menos cotados), graças aos torrents da vida, é praticada intensa e desbragadamente há cerca de duas décadas (convém também recordar o percursor - e transgressor - papel do Napster na história do compartilhamento de música via web).
Entretanto, gosto de comprar álbuns de música (em formato de CD, no caso). Ou, pelo menos, gostava.
Já cheguei a ter 822 (hoje, 307). Claro, são números ridiculamente pequenos (basta mencionar que o falecido Kid Vinil possuía um acervo com mais de 20.000 itens, sendo quase a metade em CD), mas que me dão uma satisfaçãozinha fetichista boba.
Não só isso.
A aquisição desses álbuns, penso, faz parte também do respeito e da admiração que tenho pela condição e atividade artísticas (isso parece falso e pernóstico, mas que se dane!). Quando meu grande interesse por música pop surgiu, na adolescência, não havia qualquer condição financeira para iniciar uma coleção de discos. Nem sequer tinha um emprego! Eventualmente, conseguia comprar um ou outro vinil que desejava muito, mas foi só a partir dos 23 anos que passei a contar com um salário mensal, regularmente pago. Embora baixa, é essa remuneração que me permitiu consumir música para além do rádio (com o qual tenho uma relação de amor e ódio - qualquer dia escrevo sobre isso). Os primeiros CDs que comprei - e até hoje estão comigo - foram o Facelift e o Dirt, ambos do Alice in Chains
Há cerca de dois anos, tornei-me assinante do Spotify. E tudo mudou.
A ideia de fazer pirateamento de canções na internet sempre me desagradou. Devo admitir, porém, a imensa comodidade desse expediente. Por isso o serviço de streaming me atraiu tanto: proporciona uma conveniência semelhante a de "baixar" músicas, sem me deixar contrariado.
Que ninguém me leia, mas acho o valor que pago hoje - R$ 16,90/mês - uma pechincha.
Ao que parece, empresas como o Spotify ainda não representam a solução para o mercado da música. Artistas (desde os megafamosos até os que estão buscando um lugar ao sol) não pulam de alegria com os exíguos valores pagos pela execução de suas canções nas plataformas. E mesmo com as receitas chegando perto dos 2 bilhões de euros (caso do Spotify), o negócio ainda não pode ser chamado de lucrativo. Fato é que o modelo comercial implementado pelas grandes gravadoras e praticado inalteravelmente durante as quatro últimas décadas do século passado foi atingido em cheio pela internet - ferido de morte, talvez, como aconteceu com o jornalismo. Resta saber se o streaming será sustentável economicamente no médio e longo prazos; em especial, saber se será justo para com os instrumentistas, compositores e intérpretes.
Como ia dizendo, contudo, o Spotify modificou consideravelmente minha maneira de consumir música (levando-me, inclusive, a pensar em desistir de vez de aumentar minha diminuta coleção de CDs).
Mantenho lá 15 playlists, organizadas de acordo com categorias boladas por mim ou de acordo com a "serventia" que espero delas (por exemplo, canções para se ouvir num clima de festa - ou num clima de fossa -; faixas para acompanhar minha rotina de arremessos e drills quando pratico basquete no quintal de minha residência, etc ¹.). Posso montar e alterar essas playlists em pouquíssimo tempo, passar de uma para a outra, sem dificuldade, no smartphone. Fora aquelas tantas feitas por outros usuários e pelo próprio Spotify (do tipo "This is..." ou por gênero) das quais sou seguidor. Posso continuar ouvindo álbuns inteiros também, se quiser, pois uma infinidade deles está disponível por lá. Suponho não ser diferente no Deezer ou no Apple Music. A maioria dos assinantes dessas plataformas de streaming deve fazer um uso similar ao que acabei de descrever, creio eu.
O que torna esse tipo de serviço tão fascinante para mim, contudo, não vem da descomplicação com as playlists.
É ótimo poder "pesquisar" artistas que sempre me despertaram curiosidade, mas não a ponto de me levar a comprar um disco. Posso ouvir rapidamente trechos de canções ou até álbuns inteiros de artistas de todo o planeta (estou me familiarizando com o pop de países africanos e finalmente diminuindo minha ignorância em relação ao jazz, por exemplo)! Posso "experimentá-los(las)" e, caso não goste, não existe o arrependimento de ter adquirido um CD que dificilmente ouvirei de novo ². E graças à conexão bluetooth, desfruto o que mais gosto no meu equipamento de som sem ter o trabalho de ficar trocando CDs.
Porém, o melhor do Spotify são as sugestões e dicas que aparecem para o assinante, baseadas nas faixas que se vai escutando. Descobertas da semana e Radar de novidades são um modo muito legal e suave de ir ampliando o horizonte do apreciador de música. Parece que os algoritmos podem servir para alguma coisa boa... (hmm... não sejamos assim tão apressados na avaliação positiva, como se pode ler nessa ótima matéria de Joseba Elola, publicada no El País em dezembro de 2018).
Ah, e antes de terminar, enfatizo que esta postagem não é propaganda; não estou recebendo nenhum tostão furado para tratar da empresa sueca - o que não seria um problema, diga-se de passagem. Saiba o(a) eventual leitor(a) (como já escrevi aqui e noutras ocasiões) que o mister de blogueiro, ao qual me dedico há mais de 10 anos, não me rende grana alguma. Infelizmente, aliás .
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¹ Só pra ilustrar, tenho uma playlist chamada Outside sucks, uma mistureba de gêneros (e idiomas), mas cujo agrupamento faz todo o sentido pra mim; outra chamada Prazer culpado, só com canções bregas brasileiras que eu adoro; ou a Damn heart, com canções sentimentais e românticas em inglês que as vezes me fazem chorar.
² Poderia, é claro, fazer essa "pesquisa" no Youtube, por exemplo, mas nem sempre estou no computador quando ouço música (e tenho um plano de internet bem modesto no meu celular). Além do mais, usar o Youtube para isso não ajuda em nada (ou ajuda bem pouco) na valorização de determinados(as) cantores(as) e instrumentistas.
BG de Hoje
Aprecio muito quando artistas resolvem gravar canções compostas ou popularizadas por outros artistas. E quando se trata de um álbum inteiro de covers? Tanto melhor! É o caso de Renegades, disco gravado há 20 anos pelo RAGE AGAINST THE MACHINE. Minhas versões preferidas são Down on the Street, dos Stooges, e Renegades Of Funk, que, na minha opinião, ficou muito melhor do que a original, gravada pelo pioneiro do hip-hop e do rap Afrika Bambaataa (& The Soulsonic Force). Ouça abaixo: