A adaptação para o Cinema da peça Coriolano, de William Shakespeare, foi menos literal do que A tempestade, discutida na última postagem. O filme de 2011 - dirigido e protagonizado por Ralph Fiennes - fez consideráveis modificações na ordenação do texto original. Por exemplo: "enxertou" , em certas cenas, diálogos retirados de outras; também alterou e criou novos cenários. Ainda assim, a marca habitual das versões cinematográficas da obra do dramaturgo inglês permaneceu: a reprodução, com a maior fidelidade possível, da linguagem shakespeareana.
Coriolano é uma obra de forte conotação política: mais precisamente, uma obra a tratar dos conflitos pelo poder (não se deve perder de vista que a arrogância e o orgulho aristocráticos do personagem central irão precipitá-lo na tragédia relatada na peça). Aliás, uma das grandes "sacadas" da adaptação foi dar a Coriolano uma aparência de contemporaneidade. Muitas cenas lembram a guerra na ex-Iugoslávia e, mais recentemente, os protestos provocados pela crise econômica na zona do euro. Sendo suscetível a diversas abordagens, destacarei apenas um ponto da peça - a (im)popularidade do protagonista - explorado de forma criativa no filme.
Após voltar de campanha militar bem sucedida contra os volscos, inimigos dos romanos e liderados pelo arquirrival Tulo Aufídio, o recém denominado Coriolano é escolhido, pelo senado, cônsul da república, cargo da alta hierarquia. Respeitando a tradição, porém, necessitará ter seu nome ratificado pelo povo (que, na opinião do líder militar, é um "monstro de mil cabeças", formado por "cães ordinários" e "fragmentos" de pessoas). O filme introduz um elemento impossível de se conceber no tempo de Shakespeare, mas que ajuda a ressaltar os elementos políticos, já por si evidentes, da peça: a atuação dos meios de comunicação, nas sociedades de massa, no que se refere à construção da imagem das figuras públicas (e por isso recomendaria a professores de História e Sociologia utilizar o filme em suas aulas no ensino médio).
Uma das cenas mais interessantes é a que exibe trecho de um programa jornalístico, ao estilo Canal Livre, no qual o âncora debate com dois especialistas sobre perfil e as chances de Coriolano, na tentativa de obter o cargo de cônsul. A cena reproduz o diálogo de abertura da cena II, no Segundo Ato da peça (os oficiais do texto original foram substituídos, no filme, pelo jornalista e os outros debatores do programa mencionado acima). Nesse diálogo, há uma análise sem rebuço do caráter das multidões (cito a tradução de Carlos Alberto Nunes*):
" Por minha fé, há muitos personagens de projeção que adularam o povo, sem nunca lhes terem dedicado a menor afeição, como a outros que o povo amou sem saber porquê. Ora, se o povo ama sem saber porquê, também odeia sem maior fundamento. Assim, não se preocupando nem com o amor nem com o ódio que os plebeus possam votar-lhe, Coriolano prova que conhece prefeitamente a disposição de todos eles, o que revela à saciedade com sua nobre indiferença".
Quando, assustadoramente, vê-se que um candidato da espécie de Celso Russomano chegou a liderar as pesquisas de intenção de voto para prefeito na mais rica e importante cidade do Brasil, é difícil não concordar que o "povo ama sem saber porquê" e "também odeia sem maior fundamento".
Gostaria de falar sobre a atuação espetacular de Vanessa Redgrave, no papel de Volúmnia, a mãe de Coriolano, sobretudo na cena em que esta vai implorar clemência ao filho (cena III, Quinto Ato). Mas fica para outra ocasião.
Após voltar de campanha militar bem sucedida contra os volscos, inimigos dos romanos e liderados pelo arquirrival Tulo Aufídio, o recém denominado Coriolano é escolhido, pelo senado, cônsul da república, cargo da alta hierarquia. Respeitando a tradição, porém, necessitará ter seu nome ratificado pelo povo (que, na opinião do líder militar, é um "monstro de mil cabeças", formado por "cães ordinários" e "fragmentos" de pessoas). O filme introduz um elemento impossível de se conceber no tempo de Shakespeare, mas que ajuda a ressaltar os elementos políticos, já por si evidentes, da peça: a atuação dos meios de comunicação, nas sociedades de massa, no que se refere à construção da imagem das figuras públicas (e por isso recomendaria a professores de História e Sociologia utilizar o filme em suas aulas no ensino médio).
Uma das cenas mais interessantes é a que exibe trecho de um programa jornalístico, ao estilo Canal Livre, no qual o âncora debate com dois especialistas sobre perfil e as chances de Coriolano, na tentativa de obter o cargo de cônsul. A cena reproduz o diálogo de abertura da cena II, no Segundo Ato da peça (os oficiais do texto original foram substituídos, no filme, pelo jornalista e os outros debatores do programa mencionado acima). Nesse diálogo, há uma análise sem rebuço do caráter das multidões (cito a tradução de Carlos Alberto Nunes*):
" Por minha fé, há muitos personagens de projeção que adularam o povo, sem nunca lhes terem dedicado a menor afeição, como a outros que o povo amou sem saber porquê. Ora, se o povo ama sem saber porquê, também odeia sem maior fundamento. Assim, não se preocupando nem com o amor nem com o ódio que os plebeus possam votar-lhe, Coriolano prova que conhece prefeitamente a disposição de todos eles, o que revela à saciedade com sua nobre indiferença".
Quando, assustadoramente, vê-se que um candidato da espécie de Celso Russomano chegou a liderar as pesquisas de intenção de voto para prefeito na mais rica e importante cidade do Brasil, é difícil não concordar que o "povo ama sem saber porquê" e "também odeia sem maior fundamento".
Gostaria de falar sobre a atuação espetacular de Vanessa Redgrave, no papel de Volúmnia, a mãe de Coriolano, sobretudo na cena em que esta vai implorar clemência ao filho (cena III, Quinto Ato). Mas fica para outra ocasião.
* SHAKESPEARE, William. Coriolano; MacBeth. São Paulo: Melhoramentos, 195? [tradução de Carlos Alberto Nunes]. De novo, cotejando o texto desta tradução com as legendas em DVD, notei serem idênticas
BG de Hoje
Sem dúvida, Truth é um dos melhores discos de rock de todos os tempos. Rod Stewart estava cantando muito em 1968 e JEFF BECK é sensacional. A melhor canção da dupla nesse disco, em minha limitada opinião - Let me love you - é o BG de hoje.