Interrompo a série sobre poesia, mas voltarei ao tema na próxima postagem.
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Em
novembro do ano passado, a secretária de Educação Básica do MEC, Maria
do Pilar Lacerda Almeida e Silva respondeu algumas perguntas feitas por
Luiz Costa Pereira Junior, editor da (ótima) revista Língua Portuguesa (Editora Segmento)*.
Antes de discutir o conteúdo da entrevista, considero apropriado falar sobre a trajetória da entrevistada.
Maria
do Pilar Lacerda foi também secretária de Educação em Belo Horizonte,
durante a segunda administração (2005-2009) de Fernando Pimentel -
hoje, ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Longe
de ser unanimidade entre os trabalhadores da área, aqui na cidade, foi
francamente hostilizada pela diretoria do sindicato ao qual sou
filiado. Apesar disso, é preciso reconhecer que Maria do Pilar não é
uma tecnocrata obcecada por números e cumpridora de regulamentos "para
inglês ver", nem uma acadêmica deslumbrada, imersa no "mundinho"
universitário e distante das agruras da realidade escolar (pessoas que
geralmente ocupam esses cargos nos governos, à esquerda ou à direita do
espectro político-partidário). Ao contrário, foi professora de História
na Rede Pública local por anos; posteriormente eleita, pela comunidade,
diretora do segundo colégio mais antigo mantido pelo município. É,
portanto, alguém que vivenciou o dia-a-dia da educação básica,
experiência nada desprezível. Talvez, por isso, tenha continuado no
MEC, uma vez mantido o ministro Fernando Haddad, após a eleição de
Dilma Rousseff. Pode-se concordar ou não com ela, mas trata-se de
alguém com credenciais para falar sobre Educação.
Ao
ser perguntada sobre a queda de qualidade, a partir do aumento da
oferta de vagas verificado nas últimas décadas, a secretária,
acertadamente, observa:
"Todo mundo estudava, na época [em que ela própria era estudante primária], em
escola pública. Mas quanto era esse "todo mundo"? Uns 10% da população.
O Brasil não estava acostumado a fazer tudo para todos, com qualidade".
E acrescenta:
"Para certa mentalidade [elitista], é
incômodo o conceito de algo ser feito para todos. Mas se a escola era
boa, e não para todo mundo, então não era pública. Era gratuita, não
pública".
Pilar reconhece os desafios colocados para o governo: "Decididamente, é difícil. Temos de dar conta da agenda dos séculos 18 ao 20 junto com a do 21 [...]".
Mas
é quando discute propriamente temas ligados ao ensino da Língua
Portuguesa e ao trabalho com a leitura que a entrevista ganha
importância, sobretudo no que se relaciona às desagradáveis situações
observadas na escola em que atualmente trabalho (falo disso mais
adiante).
O entrevistador pergunta: "Como reverter os baixos índices de compreensão e produção de texto?". A secretária responde:
E como a instituição escolar tem reagido?
Sobre o cenário sociocultural em que a escola está inserida, e do qual a leitura tenta fazer parte, Pilar, a meu ver, faz a avaliação adequada:
Na escola pública em que trabalho, dentro da equipe (?) de meu setor, é possível encontrar pessoas ainda presas a essa imagem idealizada do estudante e da família. Pior ainda: persistem no imobilismo e na acomodação funcional. Não vão ao encontro das crianças, adolescentes, jovens e adultos concretos, reais, com os quais deveriam interagir. Além do mais, consciente ou inconscientemente, não atuam na promoção da leitura - o que é um descalabro, em se tratando de uma biblioteca escolar. É ou não é para desanimar qualquer um?
O entrevistador pergunta: "Como reverter os baixos índices de compreensão e produção de texto?". A secretária responde:
"
É difícil trabalhar em aula com interpretação e redação, para uma
geração cujos pais não leem ou leem pouco ou mal. A leitura é
importante para essas famílias, mas pais e mães não conseguem traduzir
essa importância, nem poderiam. A escola, por sua vez, se ressente de
receber a todos, pois idealizou um aluno que não existe mais. Deve
ensinar a ler, interpretar, refletir e redigir uma população que não é
mais a de seus sonhos. Não é a família de anúncio de margarina ou dos
Flinstones, com pai, mãe, menino, menina, empregada e cachorro. Esse
desenho não existe nem mais na classe média, mas a escola formatou o
modelo de menino com quartinho para estudar, mesinha, livro na
prateleira e mãe com tempo para fazer dever com ele".
E como a instituição escolar tem reagido?
"O
fato de não estar instalada nos anos 50 já deveria mexer com a escola,
mas não o tem feito a ponto de fazê-la mover-se espontaneamente. Ao
procurar respostas, uma escola assim só vê o impasse: a culpa é dos
alunos sem base ou dos professores mal preparados? Só agora começamos a
dar um salto no debate sobre o papel do ensino para esse público novo".
Sobre o cenário sociocultural em que a escola está inserida, e do qual a leitura tenta fazer parte, Pilar, a meu ver, faz a avaliação adequada:
"A
vida contemporânea não induz à leitura. Com a Internet, TV, redes
sociais e o celular, há outro tipo de comunicação. Quando se imagina
literatura, pensa-se na pessoa relaxada, lendo Machado de Assis. Hoje,
até o movimento corporal desse leitor é outro".
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Na escola pública em que trabalho, dentro da equipe (?) de meu setor, é possível encontrar pessoas ainda presas a essa imagem idealizada do estudante e da família. Pior ainda: persistem no imobilismo e na acomodação funcional. Não vão ao encontro das crianças, adolescentes, jovens e adultos concretos, reais, com os quais deveriam interagir. Além do mais, consciente ou inconscientemente, não atuam na promoção da leitura - o que é um descalabro, em se tratando de uma biblioteca escolar. É ou não é para desanimar qualquer um?
* O papel do idioma na escola. Língua Portuguesa, São Paulo, n. 61, p. 10-14, nov. 2010 [Editora Segmento]
BG de Hoje
Quando fui professor na Rede Estadual/MG, certa vez levei esta canção dos TITÃS
para uma discussão em sala de aula, junto com uma matéria de jornal da
área da Economia. Nosso objetivo era compreender melhor a tal
globalização e acho a letra de Disneylândia (disponível aqui) perfeita para isso. NOTA: No vídeo, a atual formação da banda, com Branco Mello tocando o baixo.