quarta-feira, 17 de março de 2010

O que é estilo?


Em um ensaio*, tratando da obra de Graciliano Ramos (particularmente do livro Angústia), Otto Maria Carpeaux escreveu:

"A mestria singular do romancista Graciliano Ramos reside no seu estilo. Para salvar esta frase da apreciação como 'lugar comum' é preciso definir o que é estilo: escolha de palavras, escolha de construções sintáticas, escolha de ritmos dos fatos, escolha dos próprios fatos, para conseguir uma composição perfeitamente pessoal: pessoal no caso, 'à maneira de Graciliano Ramos' . Estilo é escolha entre o que deve ficar na página escrita e o que deve ser omitido; entre o que deve perecer e o que deve sobreviver".

Longe de desprezar a sabedoria de Carpeaux - cujo papel foi essencial para a crítica literária brasileira - deve-se admitir que sua definição de estilo não explica muito.

Consultando-se o "Aurélio" **, encontram-se no verbete - bastante longo - vinte e uma diferentes acepções da palavra estilo.

Tomemos duas delas:
  • "o aspecto formal de uma obra literária, levando-se em conta o tratamento dispensado à língua como meio de expressão: estilo subjetivo; estilo tenso; estilo colorido; estilo conceituoso.
  • "o modo de expressar-se de um escritor, ou grupo ou período literário: o estilo de Machado de Assis; o estilo dos poetas do grupo mineiro; o estilo da fase modernista".
Estilo é daqueles termos dos quais se abusa frequentemente, em diversos textos, com o intuito de dizer muito a respeito das características de determinado usuário da língua, mas que, no fundo, acaba não dizendo nada de relevante sobre esse mesmo usuário.

Por isso, sempre é válido ler matérias como a que foi publicada na última revista Conhecimento Prático: Língua Portuguesa (São Paulo; Editora Escala Educacional, nº 22, fev/2010), cujo título é A linguagem e o estilo, com a autoria de Nadiajda Ferreira, analisando a "ponte" existente entre a Linguística e a Literatura, graças à Estilística.

Citando textualmente o linguista francês Pierre Guiraud, para quem o estilo "é uma noção flutuante que sempre ultrapassa os limites em que se pretende fechá-la, um desses termos caleidoscópicos que se transformam no próprio instante em que nos esforçamos por fixá-los", a matéria parte da etimologia do vocábulo e descreve, de forma sucinta e objetiva, o trabalho de teóricos como Charles Bally, Jules Marouzeau, Marcel Cressot, David Crystal/Derek Davy, Benedetto Croce, Karl Vossler, Leo Spitzer, Erich Auerbach, Dámaso Alonso e Roman Jakobson, na tentativa de fixar a Estilística, privilegiando ora a Linguística, ora a Literatura.

Muito agradável, durante a leitura do texto, é encontrar pequenas definições do termo estilo, cunhadas por diversos pensadores.

As primeiras que se seguem são de uma "imprecisão totalizante", eu diria:

"O estilo é o homem".
(Conhecida frase de Buffon)

"O estilo é o pensamento".
(do escritor simbolista francês Remy de Gourmont)

"O estilo é a obra".
(de R. A. Sayce, estudioso da obra de Montaigne)

Outras, por sua vez, destacam-se pela economia, beleza e profundidade de sentido:

"Estilo é o que é peculiar e diferencial numa fala".
(do poeta e filólogo espanhol Dámaso Alonso)

"Estilo é a linguagem que transcende do plano intelectivo para carrear a emoção e a vontade".
(do linguista brasileiro Joaquim Mattoso Câmara Jr.)

"Estilo é expectativa frustrada".
(do linguista russo Roman Jakobson)

E, por fim, aquela que considero mais de acordo com meu próprio entendimento do termo:

"Estilo é compreendido como uma ênfase (expressiva, afetiva ou estética) acrescentada à informação veiculada pela estrutura linguística sem alteração de sentido. O que quer dizer que a língua exprime e o estilo realça".
(do teórico da literatura francês Mich(a)el Riffaterre)

Ou seja, há estilo no uso de uma língua mesmo em situações não propriamente artísticas.
__________
* CARPEAUX, Otto Maria. Visão de Graciliano Ramos. In: RAMOS, Graciliano. Angústia. 32 ed. Rio de Janeiro: Record, 1986

** ESTILO. In: FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. 2 ed, rev. amp. Rio de Janeiro, 1986. p 721 - 722

BG de Hoje

Quem acompanhava meu antigo blog talvez se lembre dessa seção - BG de Hoje. Nela, incluo canções de artistas e bandas que me agradam. Resolvi voltar com a seção para amenizar um pouco o pessimismo que marca a maioria dos textos deste espaço.

Na reestreia, vai a apresentação ao vivo do encantador grupo vocal BR6, cantando Tanta saudade, composição de Djavan e Chico Buarque. Aliás, eu descobri esses artistas no programa Sr. Brasil, da TV Cultura, apresentado por esse patrimônio nacional chamado Rolando Boldrin.