No Dicionário de Filosofia*, logo nas definições iniciais do verbete ceticismo, lemos o seguinte:
"Com esse termo, que significa busca, entende-se a tese de que é impossível decidir sobre a verdade ou a falsidade de uma proposição qualquer. Ceticismo não tem nada a ver como relativismo ou com as doutrinas segundo as quais tudo é verdadeiro ou tudo é falso, uma vez que estas pretendem fornecer um critério de decisão que o ceticismo nega existir".
O cético, simplificadamente, é alguém que duvida das coisas. E muito. Se alguém truca, ele está pronto a berrar de volta (ou apenas sussurrar, na maior parte das vezes): "Seis!".
Resolvi falar sobre esse tema ao reler dias atrás um ensaio de que gosto muito - Ficção e ceticismo, de Gustavo Bernardo**. NOTA (1): Gustavo Bernardo Krause é professor de Teoria da Literatura na UERJ e também ficcionista, cujos trabalhos, sobretudo os voltados para o público juvenil, interessam-me bastante. Noutra oportunidade voltarei a estes.
Pois bem. A definição acima falava em busca. Ao encontro dessa noção, podemos ler em Ficção e ceticismo :
Gustavo Bernardo estabelece importantes distinções:
NOTA (2): Se você, eventual leitor(a), por acaso me conhece, no plano pessoal, provavelmente suspeita - com bons motivos, aliás - que estou mais para o niilismo do que o ceticismo. Mas isso é assunto para outra cerveja...
Nesta postagem, estou particularmente interessado no que Gustavo Bernardo escreve quando procura analisar como a ficção, "a partir de algumas metáforas geradoras", pode ser importante para a discussão filosófica. O ensaísta, então, "aciona" obras - tais como Matrix, 1984, Neuromancer -, filósofos - tais como Bertrand Russell, René Descartes, Paul Kurtz, Hilton Jupiassu, Karl Popper -, e escritores - tais como Philip K. Dick, Fernando Pessoa e Luis Fernando Veríssimo - para afirmar, entre outras coisas, que "a literatura põe sob suspeição a realidade; por isso a refaz". Ou seja, o que chamamos de realidade, no fundo, pode ser outra coisa bem distinta do que estamos tomando como o real e a ficção - literária, mas também a que se encontra em outras artes narrativas - nos permite especular em torno dessa questão por meio do discurso figurativo e inventivo que propõe.
Para terminar, uma ressalva. Se o ceticismo é "logicamente impecável", como diria Bertrand Russell, por outro lado, é "psicologicamente impossível". É provável que ninguém consiga ser cético o tempo todo, nem sequer a maior parte do tempo. O ceticismo deve ser usado com moderação, diria Paul Kurtz. Gustavo Bernardo acrescenta que "a pílula cética, se tomada em excesso, conduz à dúvida arrogante que acaba por não ser mais dúvida: adquire-se a certeza de que a realidade não é real".
Assim, o ceticismo "deve ser considerado como uma regra metodológica básica: sem ela, estamos prontos a despencar na desilusão complacente e, em consequência, no dogmatismo; com ela, se usada com prudência, avançamos nas fronteiras da investigação e tiramos benefícios para a vida prática" [grifos meus]
O ceticismo é, portanto, um modo - crítico e perquiridor - de olhar para a realidade. Vamos exercitá-lo?
Resolvi falar sobre esse tema ao reler dias atrás um ensaio de que gosto muito - Ficção e ceticismo, de Gustavo Bernardo**. NOTA (1): Gustavo Bernardo Krause é professor de Teoria da Literatura na UERJ e também ficcionista, cujos trabalhos, sobretudo os voltados para o público juvenil, interessam-me bastante. Noutra oportunidade voltarei a estes.
Pois bem. A definição acima falava em busca. Ao encontro dessa noção, podemos ler em Ficção e ceticismo :
"[...] os céticos também são chamados de 'zetéticos', que significa: 'procuradores'. Ao desconfiar de dogmas, verdades definitivas ou afirmações peremptórias, os céticos se mantêm em constante estado de incerteza e investigação intelectual".
Gustavo Bernardo estabelece importantes distinções:
"enquanto os dogmáticos têm certeza de que só eles sabem alguma coisa e os niilistas têm certeza de que não se pode ter certeza de nada, os céticos duvidam de que se possa ter certeza de alguma coisa: enquanto os dogmáticos já acharam a resposta e os niilistas já pararam de procurar, a dúvida dos céticos os leva a continuar procurando a verdade".
NOTA (2): Se você, eventual leitor(a), por acaso me conhece, no plano pessoal, provavelmente suspeita - com bons motivos, aliás - que estou mais para o niilismo do que o ceticismo. Mas isso é assunto para outra cerveja...
Nesta postagem, estou particularmente interessado no que Gustavo Bernardo escreve quando procura analisar como a ficção, "a partir de algumas metáforas geradoras", pode ser importante para a discussão filosófica. O ensaísta, então, "aciona" obras - tais como Matrix, 1984, Neuromancer -, filósofos - tais como Bertrand Russell, René Descartes, Paul Kurtz, Hilton Jupiassu, Karl Popper -, e escritores - tais como Philip K. Dick, Fernando Pessoa e Luis Fernando Veríssimo - para afirmar, entre outras coisas, que "a literatura põe sob suspeição a realidade; por isso a refaz". Ou seja, o que chamamos de realidade, no fundo, pode ser outra coisa bem distinta do que estamos tomando como o real e a ficção - literária, mas também a que se encontra em outras artes narrativas - nos permite especular em torno dessa questão por meio do discurso figurativo e inventivo que propõe.
Para terminar, uma ressalva. Se o ceticismo é "logicamente impecável", como diria Bertrand Russell, por outro lado, é "psicologicamente impossível". É provável que ninguém consiga ser cético o tempo todo, nem sequer a maior parte do tempo. O ceticismo deve ser usado com moderação, diria Paul Kurtz. Gustavo Bernardo acrescenta que "a pílula cética, se tomada em excesso, conduz à dúvida arrogante que acaba por não ser mais dúvida: adquire-se a certeza de que a realidade não é real".
Assim, o ceticismo "deve ser considerado como uma regra metodológica básica: sem ela, estamos prontos a despencar na desilusão complacente e, em consequência, no dogmatismo; com ela, se usada com prudência, avançamos nas fronteiras da investigação e tiramos benefícios para a vida prática" [grifos meus]
O ceticismo é, portanto, um modo - crítico e perquiridor - de olhar para a realidade. Vamos exercitá-lo?
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* CETICISMO. In: ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. 5 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 151-153.
** BERNARDO, Gustavo. Ficção e ceticismo. In: _______. (Org.). .Literatura e ceticismo. São Paulo: Annablume, 2005. p. 89-112. OBS: Esse autor também assina seus escritos, sobretudo produção acadêmica, como Gustavo Bernardo KRAUSE; optei por Gustavo BERNARDO pois é assim que seu nome aparece na folha de rosto deste e de outros livros de sua autoria.
BG de Hoje
No último domingo estava assistindo ao (indispensável) programa Ensaio, da TV Cultura. A artista focalizada era DANIELA MERCURY, a quem sempre admirei. E olhando para minha modesta coleção de CD's, notei que não tenho nenhum disco dela (embora, noutra época, comprara dois álbuns da cantora baiana - em vinil, hoje sumidos por aí). Vou preencher essa lacuna o mais breve possível. Por enquanto, no BG, uma interpretação valiosa, das melhores de D. Mercury, para a canção Serrado, de Djavan.