domingo, 10 de janeiro de 2010

A insignificância nossa de cada dia

Muito tenho pensado, ultimamente, num soneto de Augusto dos Anjos* , o poeta brasileiro preferido de todos os pessimistas apreciadores da Literatura nacional, como este blogueiro que ora digita.

O poema não me sai da cabeça porque, às vezes - e isto está acontecendo com uma frequência acima do tolerável - começo a considerar-me inteligente (e quase todo mundo se acha inteligente), gente fina (e quase todo mundo se acha gente fina), moralmente equilibrado (e quase todo mundo se acha moralmente equilibrado). O problema é que não deveria acreditar nem um pouco nisso. Para mim, a maioria das pessoas (eu, obviamente, incluso), na maior parte do tempo de suas vidinhas insossas, não vale as flatulências que expele rotineiramente. Ainda mais na Internet, quando não somos pessoas e sim, perfis, imagens que gostaríamos de projetar sobre os outros. Ao texto de Augusto dos Anjos, pois:

"INSÂNIA DE UM SIMPLES

Em cismas patológicas insanas,
É-me grato adstringir-me, na hierarquia
Das formas vivas, à categoria
Das organizações liliputianas

Ser semelhante aos zoófitos e às lianas,
Ter o destino de uma larva fria
Deixar enfim na cloaca mais sombria
Este feixe de células humanas!

E enquanto arremedando Éolo iracundo,
Na orgia heliogabálica do mundo,
Ganem todos os vícios de uma vez,

Apraz-me, adstrito ao triângulo mesquinho
De um delta humilde, apodrecer sozinho
No silêncio de minha pequenez!"

Augusto dos Anjos, grato pelo alerta!

* ANJOS, Augusto dos. Eu e outras poesias. 47 ed. rev. amp. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006. OBS: Considero essa a edição mais elegante e bem acabada de todas as disponíveis no mercado contendo os textos do poeta paraibano.