quinta-feira, 10 de junho de 2010

Jogando água no chope da virtualidade (6)



Dois meses atrás, li um ótimo artigo* que vai bem ao encontro das ideias discutidas nessa série de postagens. Trata-se de Informação não é conhecimento: teorizando a economia política da virtualidade (disponível aqui), de Marcus Breen, ex-jornalista australiano e, atualmente, professor da Universidade da Carolina do Norte (EUA).

Não se vá pensar que, em razão de seus pontos de vista, Breen seja daqueles intelectuais refratários às inovações tecnológicas. Seus interesses estão centrados justamente na área de tecnologia da informação e sua relação com a indústria do entretenimento, principalmente no campo da música pop.

No texto citado, o autor faz a irônica pergunta: "[...] se as expertises digital e computacional têm a capacidade de transformar os seres humanos em seres mais humanos, mais satisfeitos, mais excitados, então por que reclamar?" Suas respostas merecem ser discutidas.

Os argumentos de Breen são construídos a partir de três premissas: 1) não é recomendável excluir a História de qualquer pensamento crítico e/ou teórico; 2) o "projeto iluminista", como ideal a ser atingido, está longe de ser visto como superado; e 3) a virtualidade que se experimenta por meio da tecnologia tem uma causalidade estrutural, por mais que os entusiastas do ciberespaço tentem escamotear esse ponto.

Durante a leitura do artigo percebe-se, logo de cara, o quanto o autor diverge dos teóricos da chamada pós-modernidade. Para ele, o pós-modernismo e seu "vanguardismo como rejeição à história" muitas vezes presta serviço (voluntário ou não?) ao irracionalismo que se nota em alguns discursos dos defensores das bem-aventuranças da era virtual-digital.

As questões levantadas por Breen originam-se dos "debates entre os defensores da nova ordem global da informação do virtual e os do velho mundo da racionalidade iluminista". O posicionamento é claro:

"[...] a fuga para a virtualidade esquivou-se do conhecimento, que foi substituído pela informação não-iluminista. É uma economia  política derivada, do, embora oposta ao, culto à informação, no qual os fatos informacionais e tecnológicos são antropomorfizados para falar por si mesmos, no qual a informação transforma-se em algo místico [...] O resultado necessário é uma economia política que critique a velocidade irracional e a desinformação da virtualidade".

O novo ambiente da era virtual gera "novas formações econômicas, sociais e culturais", mas diante de tais fatos "poucas pessoas se sentem capazes de reagir de forma confiável e crítica. Somos encorajados a não estragar a festa, desafiando a crise de comportamento modernista".

"nova ordem do mundo eletrônico" está em conveniente sintonia com o atual estágio econômico dominante:

"Não é de se admirar que velhas questões sobre justiça e valor social sejam tão difíceis de reivindicar no capitalismo contemporâneo? Seria também surpreendente que tanto esforço para a elaboração de novas políticas de tecnologia ainda não tenha se concretizado? Onde a economia representa tudo, a informação virtual serve como o meio acrítico de desarticulação das políticas sobre ela (a tecnologia). A economia da informação está, de forma bem feliz, ignorante em face da política da crítica".

É claro que, ao recuperar conceitos oriundos da visão marxista da Escola de Frankfurt, Marcus Breen pode acabar sendo menosprezado por lançar mão de um aparato teórico considerado obsoleto por muitos. Mas eu não penso assim.

Na próxima postagem, encerro esta série com uma crônica de Carlos Heitor Cony.

* BREEN, Marcus. Informação não é conhecimento: teorizando a economia política da virtualidade. Perspectivas em Ciência da Informação. Belo Horizonte, v. 6, n. 2, p. 157-171, jul./dez. 2001. Disponível em <http://portaldeperiodicos.eci.ufmg.br/index.php/pci/article/view/418/231> Acesso em 10/06/2010