Mas G., infelizmente, assim como alguns outros estudantes, não faz empréstimos de livros. Fiquei sabendo que sua mãe não permite, pois além de alegar falta de tempo para acompanhar as atividades extraescolares do filho (entre estas, a leitura), ela receia que o livro emprestado se perca ou se danifique e não teria como arcar com o custo de reposição*. Longe de ser uma situação rara, muitas mães, pais e responsáveis adotam a mesma postura.
Atitudes como essa sempre me fazem pensar na (des)valorização social da leitura. Sendo mais direto, me fazem pensar no ato de ler fora dos espaços escolares**. Pergunto: o ambiente familiar tem sido propício para a formação de leitores? Que papel desempenha(m) a(s) mídia(s) no estímulo (ou desestímulo) à leitura? Ler - falo num sentido mais profundo, para além da elementar capacidade de decodificar sinais gráficos - pode ser considerada uma atividade com ampla disseminação na sociedade? Acho que esses três questionamentos ajudam a começar uma discussão ***.
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Vários pais e mães (ou algum outro responsável pela criança e/ou adolescente) deixaram, há muito, de ser vistos como exemplos de leitores. O que me leva a achar que, em sua maioria, as famílias não são incentivadoras de leitura: ou porque não se preocupam em manter e incrementar uma coleção particular de livros (mesmo que modesta); ou porque não promovem passeios a bibliotecas ou visitas a livrarias; ou porque não favorecem momentos de leitura dentro da própria casa, sequer demonstrando interesse pelo que cada um está lendo (ou deixando de ler).
Quanto à(s) mídia(s), recorramos, por exemplo, à imprensa. Cadernos de resenhas são raríssimos e suplementos literários estão praticamente extintos... Quando um livro ou escritor é destacado no rádio ou telejornal, a abordagem é sempre carregada pelos mesmos lugares-comuns e só se fala nos medalhões e nos best sellers. Isso sem mencionar a ausência, nos produtos do entretenimento e na publicidade, de personagens que sejam a representação de um leitor****.
Por fim, dê uma olhada ao seu redor. Quantas pessoas costumam ler livros nos lugares que você habitualmente frequenta? É comum, nas conversas com seus amigos e conhecidos, que se troquem comentários sobre os últimos textos lidos - sejam estes informativos, literários, técnico-científicos ou filosóficos?
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Hoje, exige-se que a escola, para além da alfabetização, assuma exclusivamente a complexa tarefa de formar leitores. Missão fadada ao fracasso, penso eu, pois a sociedade que, ao mesmo tempo, perpassa e permeia essa escola, não está nem aí para a leitura. Continuo na próxima postagem, analisando alguns dados da última pesquisa Retratos da leitura no Brasil.
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* Mesmo reconhecendo que um grande número de famílias é pobre, essa alegada impossibilidade de arcar com o custo de reposição do livro é, em muitos casos, apenas um subterfúgio.
** Em tempo: não quero dizer com isso que a leitura esteja sendo devidamente valorizada nos intramuros das instituições de ensino. Mas escreverei sobre o assunto noutra oportunidade.
*** Há uma quarta questão, também importante: que ações governamentais, com o objetivo de incentivar a leitura e favorecer a formação de comunidades de leitores, seja no âmbito municipal, estadual ou federal, estariam sendo desenvolvidas? Qual a base material e o alcance dessas ações (populações atendidas, órgãos envolvidos, orçamentos, recursos humanos empregados)? Por exigir um levantamento mais abrangente, não tratarei do tema neste momento
**** E quando o leitor aparece como personagem num comercial ou programa de TV costuma restringir-se ao estereótipo do nerd.
BG de Hoje
Não me canso de assistir e ouvir: "projeto" PLAYING FOR CHANGE, War/No more trouble